O Papa, os protestos... E você com isso?!

Alguns dias após a chegada do papa ao Rio de Janeiro, e logo após alguns protestos no final de junho contra os gastos excessivos da Copa, e em favor de melhores condições para saúde e educação, houve a “Marcha das Vadias”, onde foi possível ver mulheres de seios nus gritando frases de impacto, usando a cruz como protesto, o corpo como “arma”. Dentro dessa perspectiva, muitos participantes defendiam a liberdade sobre seu corpo e sobre sua vida, alegando que o Estado deve ser laico, e que não deve sofrer a influência da igreja para decisão de determinados assuntos.

Vasculhando mais um pouco, ao fazer pesquisas à margem do evento e das manifestações, não é preciso ter “dedinhos nervosos” para ter acesso as notícias mais tristes: Crianças morrem de fome. Moradores de rua morrem de frio. Drogados morrem pelo vício e pelas dívidas com drogas. Para estes, não existiu evento algum, nem mesmo manifestação sobre o direito ao próprio corpo, pois seus corpos já estão mais do que escravizados pela fome e pelo vício, que tentam sanar dia após dia.

Nada contra a tal marcha, nem contra as reivindicações, mas pensei comigo em como seria bom se cada cartaz, cada grito, cada frase de impacto, cada expressão corporal fosse traduzida em uma ação em benefício dessas pessoas excluídas. Não precisaria nem fazer um grande esforço, de verdade. Seria mais ou menos assim: Hoje, ao invés de comprar uma cartolina para fazer um cartaz de protesto, vou pegar meu um real para comprar um pão e dar a um pobre na rua. Hoje, ao invés de despir meu corpo, vou vasculhar meu armário em busca de alguma blusa velha, mas quente, e entregar a algum morador de rua que passa frio. Hoje, ao invés de reclamar que não tenho respeito, vou denunciar algum abuso que vejo sofrer algum morador de rua, vou pedir a algum jornal que venha reportar o sofrimento silencioso de pessoas que vivem em função da droga como se não houvesse amanhã. Parece difícil?

O Papa nos disse desde o primeiro dia de seu pontificado: pense nos pobres. Nos pobres. E não importa se ele é católico. Poderia ser um chefe da igreja anglicana, um judeu, um espírita. Mas o que ele disse é um problema universal, pensar nos pobres.
 
Enquanto eu penso em como vou usar meu corpo e na liberdade que tenho sobre ele, há milhares de pessoas ao redor do mundo tentando ao menos mantê-lo em pé sob as condições mais adversas. Enquanto me preocupo sobre minha opção sexual, ou sobre fazer sexo ou não antes do casamento e sobre porque a igreja é tão conservadora e não aceita meu ponto de vista evoluído, há milhares e milhares de pessoas que só estão se incomodando em ter um teto sob o qual dormir e se aquecer. Enquanto estou pensando em sobre ter o direito ou não de interromper uma vida no ventre, há milhares de vidas sendo ceifadas pelas mãos nefastas da droga, do vício e de outras mazelas da humanidade.

Não é questão de religião: é questão de consciência. “Se eu não estou bem, não posso fazer bem a outro”, alguns podem dizer. Mas fato é que não há quem possa ajudá-lo se você não começar ajudando a si mesmo. E para adquirir respeito, nada melhor do que olhar em volta e procurar compreender e amenizar outras dores que não as suas. Porque quando paramos de olhar para o próprio umbigo e começamos a olhar para os problemas maiores, fazendo a nossa mísera parte, não existe mais o gay, a lésbica, a mulher que aborta, o renegado. Passamos a ser, acima de tudo, pessoas preocupadas com o próximo, buscando minimizar a dor de outro, que em nós pode até ser grande por não ter o respeito que gostaríamos, mas não é maior do que a de quem passa frio ou fome. E assim, quem sabe, perceber que o respeito vem de dentro, quando nos sentimos alguém melhor por ajudar. A partir desse momento não existe mais rótulo, senão um: o de gente que ajuda gente. E merece respeito!


Sobre a Autora:
Núbia Camilo é professora por formação, cantora por hobby, jornalista freelancer e escritora por paixão. Mas, o que gosta mesmo é de pensar sobre a vida e de uma boa conversa.

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