Entrevista à revista “La Lampiro"
Esse contato foi realmente uma surpresa agradável, ainda mais porque ele aceitou o convite para ser entrevistado, permitindo que você também o conheça um pouco.
Quem é André Marinho?
Sou jornalista e estou concluindo o penúltimo ano da faculdade de Direito.
Quando e como você conheceu o Esperanto?
Sempre ouvi falar do Esperanto, mas nunca havia me aprofundado no assunto. Durante a pandemia, enquanto estudava espanhol, o Esperanto me veio à mente. Movido pela curiosidade, decidi pesquisar sobre a língua e, nesse processo, compreendi sua proposta e fui cativado pelos ideais do Esperanto. Antes disso, eu nem sequer sabia que o Esperanto era uma língua planejada e neutra - eu acreditava que era um dialeto de algum povo remoto.
Como surgiu a ideia de explorar o tema “Esperanto como ferramenta para promoção da igualdade e justiça social” no contexto do seu trabalho acadêmico?
Após pesquisar sobre o Esperanto, senti o desejo de aprendê-lo. Durante meus estudos autônomos, percebi o quão mais igualitário e justo seria se o Esperanto fosse usado como lingua de comunicação internacional entre pessoas de diferentes nações, em vez do inglês, que sempre beneficia os nativos, que nem precisam se esforçar para aprender um segundo idioma. Com base nesse pensamento, decidi que este seria o tema do meu trabalho de curso, fundamentando minhas pesquisas na Declaração Universal dos Direitos Humanos. O artigo 1º estabelece que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, e o Artigo 2º garante que todos têm direito às liberdades da Declaração sem qualquer distinção, inclusive de idioma. Assim, quando a ONU adota o inglês como norma de comunicação entre as nações, ela, de certo modo, nega os valores expressos na Declaração que ela mesma promulgou.
Como seus colegas de curso e, em particular, sua orientadora, aceitaram a decisão de trabalhar com o tema do Esperanto?
Meus colegas e orientadora ficaram bastante surpresos com o tema, pois era algo pioneiro, fora dos temas convencionais dos trabalhos de Direito, que geralmente nao abordam essa interseção entre línguas e direito. Muitas pessoas sequer sabiam o que era o Esperanto. Nossa primeira orientadora até sugeriu que mudássemos o tema, pois, segundo ela, o trabalho não era relevante o suficiente no campo jurídico. No entanto, como sempre acreditei no valor jurídico e social do Esperanto, pedi permissão para encontrar um novo orientador que compreendesse melhor a proposta e compartilhasse dessa visão. A permissão foi concedida, e com a nova orientação conseguimos concluir o artigo conforme planejado.
Recentemente, tradutores automáticos têm se popularizado e, com o apoio da inteligência artificial, tornaram-se cada vez mais convincentes e precisos. Na sua opinião, o papel esperado de uma língua artificial como o Esperanto corre o risco de ser substituído por essas tecnologias?
Embora tradutores automáticos estejam se tornando cada vez mais úteis, precisos e difundidos, acredito que eles não podem substituir o fator humano na comunicação. O Esperanto não oferece apenas vantagens na tradução, mas também uma base ideológica e humanista. Ele é um idioma criado para promover a paz e a colaboração, enquanto os tradutores automáticos são apenas ferramentas para adaptar o conteúdo. Além disso, o Esperanto poderia complementar a tecnologia, talvez até se tornar parte de soluções globais, especialmente em contextos onde a comunicação oral entre diferentes nações ainda representa uma barreira.
Diferentemente de você, que quis aprender o Esperanto após conhecê-lo, muitas pessoas se familiarizam com a língua, simpatizam com seus ideais, mas nao se dispõem a aprendê-la. É possível promover os ideais do Esperanto sem falar a língua?
Sim, acredito que é possível promover os ideais do Esperanto sem necessariamente dominá-lo. Esses ideais, como igualdade, justiça lingüística e respeito às culturas, são universais e podem ser defendidos por ações que promovam a diversidade cultural e a inclusão. No entanto, aprender o Esperanto é uma forma de vivenciar esses princípios mais profundamente, pois ao falar a língua, voce se une a uma comunidade global que compartilha esses mesmos valores. Além disso, aprendendo e usando o Esperanto, você fortalece a importância da língua e começa a debater seus ideais de forma mais apropriada.
É sabido que o Esperanto respeita todas as línguas, mas combate a situação em que uma língua nacional se impõe sobre as outras. Em alguns círculos, no entanto, não raramente aparecem menções diretas ao inglês como língua dominante. Isso não poderia passar a impressão de que há uma disputa entre o Esperanto e o inglês?
É compreensível que o inglês seja freqüentemente mencionado, pois é a língua dominante no cenário global atualmente. No entanto, o Esperanto não se posiciona "contra" o inglês, mas propõe um equilíbrio diante da desigualdade lingüística. O objetivo nao é combater o inglês em si, mas buscar uma forma de comunicação mais justa, em que as pessoas possam se expressar em condições iguais, sem serem submetidas à língua de uma nação dominante. A verdadeira luta é contra o desequilíbrio, que favorece os falantes nativos de línguas hegemônicas, como o inglês.
Recentemente, de diferentes lados, surgem vozes pedindo reformas na ONU, que já tem 60 anos. Na sua opinião, quando essas reformas se concretizarem, a organização estará suficientemente madura para considerar a adoção do Esperanto, ao menos como uma língua de trabalho adicional?
Acredito que reformas na ONU podem abrir espaço para discussões mais amplas sobre questões de comunicação global e inclusão. Quando a organização estiver mais madura e focada na igualdade lingüística, a ideia do Esperanto poderá ganhar força, ao menos como uma das línguas de trabalho, pois oferece uma solução prática e neutra para facilitar o diálogo entre nações.
Ao pesquisar sobre o Esperanto, qual outro aspecto da língua você consideraria digno de estudo mais aprofundado?
Um aspecto fascinante, que merece mais estudo, é o impacto cultural do Esperanto ao longo da história. Como uma língua planejada que transcende fronteiras nacionais, suas implicações no campo da sociolingüística e seu papel nos movimentos pela paz e justiça globais são muito relevantes e pouco explorados.
Respostas rápidas
Passatempo
Ler, escrever e caminhar ao ar livre.
Livro favorito
A biografia de Steve Jobs.
Frase favorita
"Grandes homens não nascem grandes, tornam-se grandes."
Leitura atual
Mestres do comando, por Barry Strauss.
Escritor favorito
Walter Isaacson.
Instrumento musical
Piano.
Prato preferido
Bife com purê de batatas.
Mascote
Não tenho, mas gostaria de ter um cachorro.
Lugar ideal para viver
Uma chácara num lugar tranqüilo.
O que mais te incomoda?
Desrespeito.
Maior medo
Fracassar em viver plenamente.
Qualidade que mais valoriza
Respeito.
Família
Desafio.
Humanidade
Enorme potencial, ainda por ser realizado.
Vida
Casualidade.
Paz
Silêncio interno em meio ao caos.
Ideia central do Esperanto
Unidade na diversidade.
O que você mais aprecia em seus amigos?
Autenticidade.
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Nota: Essa entrevista foi concedida à Associação Paulista de Esperanto e publicada originalmente em esperanto na edição número 189 da revista "La Lampiro". A versão original pode ser acessada integralmente no site oficial da associação, clicando aqui.
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